sexta-feira, 29 de janeiro de 2010
Famigerado Carnaval de Quelimane
De Carnaval só ficou Naval
O tão famigerado Carnaval de Quelimane.
Estacios Valoi
20/01/10
Conforme enfatizou o secretario Geral do Partido Frelimo Filipe Paunde na entrevista feita para o nosso jornal Filipe, cargo de direcção e/ou chefia ‘exigem confiança politica’.
No meu périplo pela cidade de Quelimane para ouvir falar do tão falado carnaval do ‘pequeno Brasil não foi mais do que a pé na possa.
A 16 km de Maputo todos os anos no mês de Fevereiro realiza se o carnaval nesta cidade, por sinal um dos símbolos pela qual é bem conhecida, contudo nos últimos anos a aderência ao evento não é das melhores, tendo como um dos problemas graves a ausência participativa de varias empresas de forma a dar mais ‘gás ‘ a esta festa de longa data e com muitas historias por contar.
Como dizia Sérgio, completamente perplexo com o rumo dos acontecimentos, com perguntas e respostas que só os outros saberão responder
‘Mas que carnaval se vai dançar se é que ainda existe por estas bandas e como dizia o meu interlocutor não sabia se era a amizade que mina o desenvolvimento do Pais, ou não se saber separar as coisas. A título de exemplo questionava sobre o que o musico Mc Roger estava a fazer f na tomada de posse do Presidente Guebuza, mais ainda actuar perante aqueles chefes de estado, delegações que se fizeram presentes no acto da investidura. Tem músicos como o Alexandre Mazuze, a Mingas e outros que cantam algo de raiz, com aquele toque tradicional moçambicano. Aquilo foi brincadeira de mau gosto’.
‘Uma coisa é você fazer algo com conhecimento de causa e a outra é ter um amigo engenheiro de Construção civil que te convida a fazer parte da construção de uma ponte quando você não entende nada da matéria e a ponte cai! É o que esta a acontecer aqui nesta merda de Quelimane’.
De tanto ouvir o Sérgio, a minha curiosidade foi se agudizando, afinal de contas trata se de um de uma festa que em tempos longínquos Quelimane era famosa por ter o melhor carnaval, mas carnaval mais enraizado onde outrora considerou se de pequeno Brasil por ser multicultural e este já é parte da tradição local. Contudo os últimos carnavais como o do ano [passado que registou total ausência relativamente a participação das empresas’ patrocínio foi completa tendo o Município local sido forcado a desembolsar dos seus cofres cerca de 400.000mt, receitas provenientes das colectas nos, mercados.
‘São problemas de vária ordem que vem minando daquilo que era considerado de Carnaval porque actualmente as pessoas confundem tudo, criatividade não é fazer coisas só porque se tem dinheiro, os meus pais e mantém a sua tradição, mesmo que procure o luxo e conforto, isto, não significa que devo ‘atropelar’ as raízes culturais dos meus progenitores, pelo contrário tenho que a preservar ‘.
Segundo Sergio os outros Carnavais de Quelimane elogiados não só a nível nacional foram realizados ali na praça mas elogiados porque estavam carregados de cultura, entretenimento e hoje esta se a entrar na época do Carnaval e não há quase nada. Em anos anteriores nesta fase estavam todos a ensaiar.
‘Perguntaste a alguma criança quando é que será o carnaval. ‘hoje ‘só participam crianças entre 0s 16 e 20 anos, numa festa que é para todas as idades e anteriormente encontravas pessoas dos 20, 35 anos em diante a desfilarem, boas bandas como o dançarino Ratan que abrilhantava a festa e o falecido musico David e tinha s musica ao vivo ate as 4 ou 5 horas do dia seguinte, verdadeiro ‘Samba’, batuques saias feitas de latas, de folhas de bananeira, blusas chapéus para a ocasião’.
A famosa cozinha da galinha a Zambeziana, palmeiras, jardins os abacaxis gigantes nesta província populosa no seu interior como no litoral de línguas tradicionais como o Chwabo, Makwas, lomwe, de cultura miscigenada crioula a comida típica a óleo de palma de riqueza cultural espectacular hoje o carnaval parece mais abrasileirado, o mais agravante se é que ainda se pode chamar de carnaval. Melhor naval que não caio em erro pelo menos fico entre o 'car e o naval'
‘Hoje só tens playback e quando me recordo daquela época é tanta a tristeza que me pesa. Vai ver este carnaval e dirás que é uma palhaçada, tirar dinheiro de um lado para investir numa tristeza’.
Era Musica ao vivo ate as 4 ou 5 horas do dia seguinte ‘samba’ de verdade e não musicas a moda Playback como se faz actualmente. Hoje o carnaval virou uma espécie de ‘ zona quente’ prostituição a torto e direito’. Escolhes a prostituta que bem te quiseres. Tudo bem estamos num sítio de laser mas vamos conservar aquilo que é nosso ‘.
‘Desde que nasci aqui em Quelimane participei em todos os carnavais, no pavilhão do Benfica um completamente natural, ao largo dos CFM cheio de barracas e actualmente só vou ao carnaval porque os meus amigos estão lá, sento me com a minha mulher na barraca a beber e comer’ .‘Os carros alegóricos feitos de madeira as mascaram, os grupos da cidade como o Carlos S, a Coquinha, a festa no pavilhão Benfica, a mucapata e a galinha cafreal o som de samba e vestimentas especiais já era. Já nem se sabe quem é a rainha de que escola de samba vem, qual foi a vencedora do ano passado é só sentar comer e beber’.
Em 2009 o Edil do Município Pio Matos numa entrevista reconhecia que nas primeiras semanas do festival nas primeiras o som não era dos melhores. Ano este em que a empresa de telefonia móvel mCel deixou de patrocinar o evento.
‘Quelimane sem carnaval não é Quelimane a semelhança do que esta a acontecer com a Casa da Cultura, ‘passar a ser Assembleia Municipal ‘! Há faço parte da geração Bis, fizemos um projecto com o Dr. Baizamo e solicitamos um espaço para as nossas actividades onde jovens dos vários bairros se reuniam e debatiam varais questões de entre elas a problemática do HIV/Sida, o espaço foi tomado pelos camaradas e não quero citar nomes, passou a ser deles porá. Hoje Comité do partido. E diziam eles mas que é isso de Geração Bis ! isto é do partido. É muito triste’
Luka Mukhavele
em concerto no tradicional CCFM
‘ Foi sempre meu sonho de infância ser musico’
Estacios Valoi
13/01/10
Das terras do Chilembene sua terra natal Mukhavele ou o ‘Muguijana’ nome que se as pessoas provenientes daquela zona do sul de Moçambique, digamos quem chega a província de Gaza-Macia em direcção a Cidade de Xai-Xai desvia a esquerda e dali em diante esta em solo Guija.
Na altura pensei em assobiar, para ver se ia aos tempos da pastagem do gado, mas bom não ter feito porque nem tudo faz parte da pastorícia.
EV - Como é que foi para ti começar a tocar música tradicional e o teu primeiro instrumento?
LM - De facto os diferentes instrumentos estão ligados a diferentes contextos não só a pastorícia, existem instrumentos ligados a cerimónias religiosas, rituais. Mas o primeiro instrumento que toquei, muitos destes aprendi na infância mesmo que não tivesse o contacto directo com alguns mas já os consumia teoricamente.
Alguns tocava na pratica porque estavam sempre em meu redor e de quando em vez mexia e via qual era a técnica, foi mesmo na infância contudo não sei com que idade mas sempre gostei e andei próximo dele, isto é, onde houvesse um evento musical fazia me presente e absorvia a musica.
Ev- Quando é que começa a expor esta música em palco para o público?
LM -As primeiras vezes que fui ao palco, foi no internato onde vivia no Distrito de Namaacha onde cheguei em 1980 e por volta de 1982 no centro existia um grupo de musica residente que tinha o seu próprio equipamento e regularmente actuava naquele palco ate que um dia pedi para tocar, deixaram me subir e pela primeira vez toquei guitarra eléctrica.
Normalmente em casa tocávamos aquelas violas feita de lata de azeite ou outra coisa, foi com estas que comecei, mais tarde transpus o meu reportório para a guitarra acústica para além do piano acústico que também existia no centro. Mas antes disso fui exposto a musica porque o meu irmão mais velho era seminarista e organista na igreja Católica de Chilembene, tocava, aprendia música e nos fins-de-semana voltava a casa com guitarras, incluindo aquela música na comunidade em particular depois da independência de Moçambique naquelas actividades culturais dos tempos de Samora Machel que a presença era mais ou menos obrigatória ‘convocatória’ onde convergiam grupos musicais da zona e não só onde praticavam diversas danças e cantos para o povo. Aqui aprendi muita coisa.
EV- Musica tradicional. Foi sempre um sonho teu te tornares musico principalmente neste vertente?
LM -Sim sempre foi. Porque sempre que me lembro, desde a minha infância pensei que esta seria a minha profissão, houve tempos em que este sonho parecia estar nublado porque os caminhos são sempre imprevisíveis mas o sonho não morreu. Quando pensei que devia formar me como musico a minha primeira foi como professor de línguas - Inglês, trabalhei nesta área e a seguir em outras como a electricidade mas sempre a fazer música. Naqueles tempos não havia muita opção para fazer musica, a falta de escolas para além da Escola Nacional de Musica. Passei por lá em 1985 onde aprendi a teoria de musica mas nessa altura estava a fazer a formação de professores e nos tempos livres ia a musica ate que chegou uma altura em que não deu para continuar, foi a segunda vez em que fui formalmente exposto a musica de maneira cientifica para alem do Internato de Namaacha onde também aprendi a um pouco sobre a teoria de musica e noções da leitura.
EV- Esta incursão pelo mundo da música, a tradicional apesar da avalanche Samoriana em termos de convocatórias. Acreditaste que havia continuidade ate te formares e prestes a finalizares o mestrado em musicologia?
LM- Foi sempre um sonho e quando a gente sonha o sonho vem. Os outros dizem que o sonho vem dos espíritos que nos vão guiando através do sonho. O que posso dizer é que foi uma chamada, senti um apelo pela música que não consegui resistir apesar de todos os obstáculos que fui encontrando pelo caminho mas o magnetismo foi sempre forte e acabei voltando a música, não sabia se isto iria se materializar mas sonhava que isto se materializasse. Há sonhos que fracassam e outros que vivem.
EV- Actualmente como é que vê a música tradicional em Moçambique?
LM -A musica tradicional é muito rica apenas precisa de ser trabalhada em todas as vertentes possíveis, principalmente na cientifica e artística mas é preciso pesquisar, ir buscar e analisar as coisas separadamente e voltar a uni-las. Naturalmente alguns aspectos da música que vão sobrando devido ao processo de evolução mas actualmente para esta se enquadrar na sociedade e funcionar há algumas coisas que ela tem que deixar atrás que não se enquadram porque a musica sempre foi funcional e continua sendo parte de diversas actividades.
É como as coisas que se fazem, sem música não era possível organizar um ritual, a música também é um ritual é parte integrante do ritual não é só para acompanhar. Não era ‘só entretenimento mesmo que as pessoas depois tocasse e dançassem dentro daquele ritual. É a função da música porque sem ela aquele ritual não iria acontecer e ate hoje nós continuamos a constatar isto mesmo em cerimónias religiosas a exemplo dos ‘Maziones’, na igreja Católica aqui ou no ocidente e que sem música não existiria apesar de constatarmos a oração que é cantada mas sem aquela música, canção aquelas pessoas não rezam. É nesta perspectiva que vejo a música.
EV- Olhando para esta perspectiva, o investimento na musica principalmente a tradicional pareci me insignificante?
LM- De facto há pouco investimento. Penso que tem mais a ver com aspectos de índole políticos, o que deve ou não ser feito. Essas pessoas desenham as suas estratégias de acordo com os seus objectivos, creio que é um erro grave por parte dos fazedores da politica porque a musica tradicional é aquela que mais nos alimenta, que nos da forca, que garante a continuidade ligando o passado presente e o futuro. Musica é um meio de comunicação de educação, de ensino mais ainda um elo de ligação na vida dos homens. As pessoas começam a importar muita música ignorando a autóctone, e começamos a perder muitos valores.
EV-Alunos na música tradicional. Como é que estamos?
LM - Há muitos que aprecem interessados em aprender, talvez não esteja disponível para leccionar as pessoas de forma individual porque penso que é muito tempo para ensinar uma única pessoa. Actualmente estou a trabalhar com a Universidade Eduardo Mondlane e com outro grupo com cerca de 50 alunos e é gratificante ver que aquela informação é consumida por um grupo maior e espaço para que esta tenha continuidade. Os outros vêm a minha oficina aprender a construir instrumentos tradicionais.
Prestes a realizar um concerto que expectativa para o publico?
LM - O concerto vai ser realizado no dia 19 de Fevereiro no centro Cultural Franco Moçambicano e terei os meus acompanhantes afinal de contas quem é que vai a batalha sozinho! De princípio conto com o Filipinho no baixo, Zito, Leonelio na bateria, Pedro Justino da companhia na precursão, Hélio na guitarra, Carolina, Dulce e talvez a Noémia no coro e com Eugénio Santana também da faculdade de musica da UEM no xilofone.
Quanto ao público tem que esperar algo inédito, uma nova experiencia, nova proposta para os artistas, forma de pensar e de organizar a música e para os políticos uma proposta diferente de olhar para a realidade, de digerir a nossa sociedade.
quinta-feira, 28 de janeiro de 2010
CASA DA CULTURA ZAMBEZIA QUELIMANE
Era uma vez a casa da cultura da Zambézia
Estacios Valoi
27/01/10
Gualino Da Silva Grimone é dançarino de raiz e o actual ‘timoneiro’ da Casa da Cultura da Cidade de Quelimane -Zambézia
Vindo das terras de Milange, onde há muitos anos aprendeu a dançar, aterrou no dia 15 de Janeiro do ano 2000 na Casa da Cultura da Zambézia - levado pela única razão que vem carregando durante todos estes anos: dançar.
Elemento da Companhia Provincial Montes Namule virada para a dança tradicional, o jovem esteve envolvido em algumas formações na sua maioria ministradas pela Companhia Nacional de Canto e Dança (CNCD) principalmente na dança contemporânea moderna.
EV - Dança contemporânea vs dança tradicional. O que se deve fazer para que ambas as correntes andem nos mesmos carris?
Gualino Grimone - No mês de Dezembro do ano passado tivémos uma formação feita pela Companhia Nacional de Canto e Dança (CNCD) que abraçou a dança contemporânea; nela estiveram elementos da CNCD com o Lulu e outros elementos. Contudo, o nosso grupo está mais virado para a vertente da dança tradicional típica da Zambézia mas temos momentos em que também dançamos a contemporânea incorporando tudo num só corpo.
EV - Em que estágio está a dança tradicional aqui em Quelimane?
GG - Primeiramente dizer que está num estágio avançado considerando que tudo e todos têm a dança como tradição no seu dia-a-dia. Mas falta-nos apoios que nos levariam a um nível mais desenvolvido; e de facto precisamos de sobressair.
EV - Agora olhando para a vossa casa da cultura, nova roupagem ‘ tinta branca’ e pela primeira vez um novo sistema de frio a ser instalado, a falta de apoio de que falas em que se circunscreve?
GG -Senhor jornalista o investimento que você está aqui a ver está ligado à Assembleia Municipal da Cidade; ‘camadas’ que tencionam utilizar o salão da casa para fins que só a eles diz respeito. O município está a remodelar a sala com um sistema sofisticado mas exactamente para dar vazão ás suas sessões e reuniões mas penso que a actividade cultural não vai parar.
EV - Casa da Cultura ou da Assembleia Municipal? E nos dias em que os vossos eventos coincidirem com os do Município o que vai acontecer?
GG - Esta é outra questão, não sabemos como é que as actividades serão realizadas no dia em que o nosso evento coincidir com o da Assembleia; acredito que a prioridade no uso do nosso espaço ‘salão ‘ seja para a ‘Assembleia dos Camaradas’.
Eles estão a reabilitar a casa não exactamente por razões culturais mas para as ‘politiquices’.Em dias como estes a única alternativa será procurar outro espaço.
EV -Não acha que deveria ser o próprio município a procurar uma outra sala?
GG- Penso que é injusto o município transformar a casa da cultura numa assembleia, mas segundo o argumento do órgão Municipal, o salão será ocupado só nos dias em que tiverem sessões.
Patrocínio, patada causa e efeito. Qual é a participação das outras instituições e empresas em prol do desenvolvimento cultural local?
GG - Alguns têm participado, mas é necessário fazer um grande esforço escrevendo cartas e por muitas vezes passá-las porta a porta até que o apoio chegue às nossas mãos.
EV - Voltando à cultura de facto, quantos grupos existem aqui na casa de cultura e o número de pessoas?
GG -Neste momento apenas existem dois grupos, nomeadamente a Companhia Provincial de Dança Tradicional Montes Namule e o grupo de Canto e Dança da Casa da Cultura; ambos são os que apresentam qualquer evento a ser realizado na casa da cultura, mas pelos bairros também existem outros grupos fortes no campo tradicional.
EV - Dizes Dança Tradicional em pleno desenvolvimento. Quantas apresentações tiveram no ano transacto?
GG - O Grupo de Canto e Dança teve algumas actuações dentro da Cidade de Quelimane; outro sobre a ponte do rio Zambeze com Emílio Armando Guebuza no dia da inauguração e a nível da Província em Malei, na Maganja da Costa e em Pebane.
EV - Em termos de aparições existe ou não um défice considerável?
GG - O nosso trabalho é apresentado através dos contactos que temos com algumas empresas que nos vão ajudando a não esquecer a tradição. Infelizmente ainda não saímos para fora da província devido à falta de oportunidades, e não é fácil, é preciso cumprir com muitos requisitos onde geralmente os patrocinadores falam de custos.
O meu grupo é composto por cerca 40 elementos, portanto, tratando-se de actuações fora da cidade ou província não são todos que participam. Somos obrigados a levar 15 ou 17 elementos por falta de recursos, o que dificulta o nosso trabalho. E por esta ausência de apoios, muitos dos dançarinos acabam tendo o seu sonho frustrado e desistem.
EV - Em traços gerais pode se considerar o estágio cultural quelimanense de deficitário?
GG -Bem, em alguns aspectos não está bom mas se tivéssemos patrocinadores estaria melhor porque aqui temos muitos e bons artistas para fazer cultura.
EV - Para além da dança onde mais se podem ver eventos culturais?
GG - Não há nada para ver. Muitas vezes só existem eventos culturais de peso em dias festivos mas principalmente quando estão todos os grupos da cidade incluindo os dos bairros. Gostaria que a cultura crescesse, mais troca de experiência com as outras províncias; isto para além dos vários projectos que temos. O artista daqui é de vários sonhos e gostamos de os realizar e este é um dos meus sonhos: continuar a dançar.
quarta-feira, 20 de janeiro de 2010
JARDINS PERDIDOS
‘A pintura tem que ser verdade ’
Texto e fotos por Estacios Valoi
30/12/09
De Lorenço Marques, Maputo, Carlos Fornazine, filho de um operário e escriturário dos Caminhos de Ferro (CFM) foi deixando lembranças no Bairro da Polana numa infância da qual bem se recorda das viagens nostálgicas pelos parques verdes, os jardins, a marginal, essas coisas todas de um menino jovem… e por ai afora.
Nascido em 1960, por coincidência ou não, na rua do Núcleo de Arte onde mais tarde viria a fazer parte daquela casa onde vários artistas plásticos da praça vão surgindo. Com algumas exposições individuais e colectivas, Fornazine começa a aprender rasgar a tela, cruzando cores, pinceladas, o verde e a mulher… exprimindo os seus mais profundos sentimentos.
E.V: Dos 12 anos de idade até hoje, os teus 50 anos, como é que descreves esta coisa de pintar?
C.F: Para mim a pintura tem a ver com o DNA. Acho que pinto aquilo que eu sou, nós não somos o princípio nem o fim de nada mas sim e sempre a continuidade de alguma coisa, acho que cabe a mim dar continuidade àquilo que já fui no passado.
É na pintura que devo mostrar como sou exactamente e quando me refiro ao DNA quero dizer que pinto aquilo que sou e não consigo fugir à minha maneira de ser e estar. As coisas que normalmente pinto são aquelas que vêm carregadas dentro de mim, a pintura tem que ser verdadeira e não uma invenção, tem que vir de dentro.
E.V: Pintar foi um sonho de infância?
C.F: Sonhos de infância! Não. A pintura acontece na minha vida de um momento para o outro. Sempre gostei de desenhar, nunca prestei muita atenção mas é em 1996, 1997 que surge em mim com bastante intensidade. Em vez de escrever, ou tocar um saxofone, pintei, então tudo remonta dos meus tempos de infância, porque sempre fui uma criança feliz embora não fosse filho de pais ricos.
Depois de ter estado a pintar desde os 12 anos de idade, penso que começo a pintar exactamente pelo verde, a clorofila e as cores. Na minha pintura predomina o verde, as flores e a mulher que é o princípio e o fim de tudo, apesar de ter 50 anos de idade, não mudei tanto naquilo que é essência do que faço. Penso que estou no mesmo sítio.
E.V: Teu ‘ ponta pé’ de saída pelo, verde, flores, jardins, parques. Hoje como é que vês esses parques ou jardins, e a mudança física ou arquitectónica da cidade de Maputo?
C.F: Outros tempos, naquela altura eram menos e havia mais tempo para nos ocuparmos dos espaços verdes, jardins, parques infantis, lagos, os peixinhos, aquela coisa toda da infância. Hoje estamos numa outra dimensão, diferente sistema, todo o espaço que era verde ou nesse mesmo espaço podia ou surgiu um prédio. Não podemos dizer que ontem era melhor e hoje é pior, cada tempo na sua hora. Recordo a infância com muita saudade, hoje as pessoas não são as mesmas, os jardins também não, mas a cidade é esta, a capital, é esta cidade minha querida.
E.V: Fases diferentes e hoje com filhos e netos em que jardins vão os teus filhos brincar se naquele espaço já existe um prédio?
C.V: Não sei, penso que existem muitos jardins e a cidade tem que crescer para fora. Eu cresci aqui na cidade de Lorenço Marques, hoje Maputo, mas aos 9, 10 anos fui para o bairro da Liberdade na altura Bairro Silva Cunha. Corria descalço, pés sujos, as micaias, a caca, a fisga essas coisas todas. A Cidade tem que crescer para fora e jardins podem haver muitos nestes sítios limítrofes, Infulene, T3,Congolote, Zimpeto e estas crianças de hoje neste âmbito terão os seus jardins. Estamos a falar de Maputo, que já era, acabou. Maputo é uma cidade comercial, não há mais jardins, tem gente a mais, carros a mais… adeus jardins!’ ‘ Vejam se não começamos a estacionar as nossas viaturas nas nossas varandas do 33 andares’!
E.V: Parece me que só mudam os números. Prestes a saltar de 9 para 10 que balanço fazes do teu trabalho?
C.V: A pintura é a minha vida, anos bons, melhores outros mais ou menos. Este foi mais um ano em que se vendeu. Vou abrir uma página na internet, estou a acabar de fazer o meu primeiro livro que versa exactamente sobre a minha pintura que vem com o titulo ‘A pintura tem que ser Verdade’, porque se a pintura não for verdadeira serão só cores, tintas, formas e o material didáctico.
E.V: ‘A pintura tem que ser verdadeira’. Como é que é viver da pintura ou viver como artista plástico em Moçambique?
C.V: As artes plásticas não têm que deixar de existir ou de praticar a pintura porque o País vai melhor ou menos mal. Penso que cada coisa deve estar no seu devido lugar. Fico meio aborrecido porque nas entrevistas geralmente perguntam assim ‘Será que em Moçambique é possível viver da pintura’? Penso que uma coisa não tem a ver com a outra porque nós vivemos num País emergente que ainda vive de doações.
A pintura deve existir naquilo que é o seu âmbito, dizer que vivo muito bem da pintura e que sou feliz, seria gozar de uma data de gente, até com melhor formação mas que é desempregada.
Viver da pintura num País como este, talvez o Malangatana, Naguibe, Manqueu, o Chissano escultor se ainda fosse vivo, pessoas que estão mais adiantadas neste panorama cultural das artes plásticas.
E.V: Âmbito cultural num país que vive de doações. Que pensas que se está a fazer em prol do desenvolvimento cultural?
C.V: Não sei. Nós os artistas temos a paranóia de que o Estado na pessoa do Ministério da Educação e Cultura devia dar mais, não vou dizer que não. Penso que cada artista deve fazer algo por si, ser artista num País como este não é fácil, o artista tem que velar por si, ver como é que vai comprar o material, fazer as obras, como apresentá-las, onde é que vai buscar o patrocínio, como é que vai fazer a exposição, quem é o potencial comprador e deixar de lamentar dizendo que o Estado não apoia. O governo tem outras coisas mais importantes como foco. Cada um por si, mas não quero dizer que não devemos conviver em associações como o núcleo de arte, a casa da cultura do Alto-maé e tantas outras que vão surgindo. O artista deve ter a mentalidade de que ele deve valer pelas suas acções e não ficar à espera que o governo esteja ali como uma muleta. Não é fácil.
E.V: Um livro e uma exposição na forja. Quanto à exposição, será individual ou colectiva? E como será intitulada?
C.V: O título da exposição virá com o tempo, possivelmente será uma colectiva mas com a mesma abordagem, com pessoas que compartilham esta minha maneira de ver as coisas, não me posso esquecer que sou africano moçambicano. Recentemente findou a 17ª Conferência sobre o clima em Copenhaga na Dinamarca, penso que os condimentos das minhas obras vão estar na esteira de tudo que tem a ver com esta problemática do clima, aquecimento global, as flores, as plantas, os animais que estão em vias de extinção, e esperar para ver.
E.V: Que ilações da conferência?
C.V: Penso que seria justo de facto que os países mais industrializados e capitalizados parassem e pensassem em nós os outros, países emergentes ou do terceiro mundo. Agora temos um outro problema que é o factor corrupção que faz parte do processo evolutivo não só do nosso País mas da maioria dos africanos.
Viva a pintura, viva as artes plásticas, e não é por não ser possível viver das artes plásticas que elas vão deixar de existir.
quarta-feira, 6 de janeiro de 2010
CARA MASTREY
Mastrey, a digressão mais esperada
Estacios Valoi
06/01/10
Cara Mastrey nascida nos Estados Unidos em Minneapolis Minnesota (MM) é a quarta filha de um conjunto de cinco irmãs, filha de pai americano marine e de mãe italiana. Seus pais e familiares, ao todo 12 pessoas, emigram da Itália para o país do ‘Tio Sam’ e durante anos enfrentaram uma fase difícil durante a depressão económica que só a história pode contar. Cara cedo parte para a Irlanda, seguida de Escócia, Inglaterra e Alemanha, regressando mais tarde a Los Angeles, onde reside actualmente.
São muitos os músicos, professores, poetas que surgiram da sua família. A avó foi uma professora de piano na Escola de Música de Macphail em MN e a mãe, fundadora da Escola de Música ‘Carrinho’ na mesma cidade. Todas as irmãs cresceram a trabalhar em restaurantes da sua enorme família, alguns conhecidos no mundo, tais como Mama Rosa’s, Angelina Valentino em Minneapolis Minnesota (MN) e Iowa.
Mais tarde ainda na sua tenra idade se torna dançarina e ginasta. Na altura muito tímida, dificilmente conseguia falar com as pessoas. Dançou em palcos como forma de se libertar e se expressar.
‘Éramos uma família italiana-americana unida, partilhávamos um amor profundo pelas artes, música, comida, amigos e todos os dia eram de risos.
E.V: És casada?
C.M: Tive um casamento formidável. Com o meu marido, vivi e actuei além fronteiras. Actualmente estou comprometida num relacionamento que existe desde há 10 anos. Vivemos em comunhão e considero-o meu marido.
E.V: Pelo leque de actividades que vens desenvolvendo… é muita a adrenalina. Andas em cocktail da droga para actuares?
C.M: A actuação é a minha droga.
E.V: Quem é a Cara Mastrey por detrás da cantora, e como é que vive?
C.M: Sou uma mulher forte, apaixonada, com um cérebro que nunca pára de criar e com o desejo de sempre inspirar os outros. A criatividade dá azo à liberdade de expressão e de pensamento. As crianças e os jovens são a minha preocupação. Continuamos crianças e a música mantém-nos jovens. Acredito que quando não criamos, as nossas almas começam a dissipar-se e meu propósito é partilhar a dádiva, o prazer de cantar e através da música do amor que transmito poder viver em paz e harmonia com o planeta.
E.V: És compositora, cantora profissional, actriz e artista desde os 15 anos de idade em Los Angeles. Para além disto tens a graduação do cinturão preto em artes marciais e incorporas esta prática no teu dia-a-dia.
E.V: Quantas noites e dias vêm traçando a tua música?
C.M: Sempre. Sempre escuto melodias maravilhosas que vagueiam dentro da minha cabeça. Na música comecei com uma harmonia natural. A minha primeira banda era formada por mim e as minhas irmãs onde escrevi a minha primeira canção ainda na minha adolescência e fui crescendo na banda Tawn em que a minha irmã mais velha era a líder.
E.V: Quando é que realmente decides entrar pela música?
C.M: Cresci sonhando em ser uma actriz, dançarina e professora. Quando me cansei da indústria cinematográfica, continuei fazendo algum trabalho como hobby ou extra em Los Angeles como modelo, participando em aulas de representação, sempre batalhando. Na altura fui considerada muito exótica, fiz algumas comédias na ‘Sala de Memórias’ no verão na abertura da série do comediante Robbin Williams, o que foi muito divertido! Também representei em filmes como Blues Brothers ou Mobster mas senti que não tinha espaço suficiente para criar. Naquela fase o meu namorado era músico na sua própria banda e por coincidência ouviu-me cantar na Rádio. Ele não fazia a mínima ideia de que eu podia cantar, perante ele sentia me envergonhada até ao ponto de não conseguir expressar os meus dotes artísticos. De seguida convidou me para cantar na banda dele e desde então tive muitas bandas partindo do pop rock, hard rock, rock alternativo, acústico, blues, jazz e hoje heavy metal.
E.V: Que te inspira?
C.M: O Amor.
E.V: Quantos álbuns e qual seria o teu favorito?
C.M: Tenho milhares de álbuns e CDS que na sua maioria fazem parte da colecção privada da minha irmã Tawn. Não poderia mencionar os meus favoritos por serem muitos. Quanto ao meu álbum pessoal todavia ainda não lancei, à excepção de um CD para aulas de música intitulado ‘Canta com Mastrey’ (Sing with Mastrey) e hoje pode ser encontrado no http://www.rocksource360.com. Este ano lançarei o meu primeiro álbum, é pesado e maravilhoso. A minha mais recente música favorita foi a que escrevi com o meu parceiro da escrita Dodd Lowder, que é a música de apresentação para a digressão da TMF, onde constam líricas como Slay the Dragon’ as mais favoritas da Tawn para além de que esta foi a promessa que lhe fiz antes da sua morte.
E.V: Quem são as pessoas que cruzaram as tuas bandas e que farão parte desta digressão tão almejada da Fundação Tawn Mastrey (TMF)?
C.M: A fundação Tawn Mastrey da qual sou directora executiva vai levar a cabo esta tournée com o intuito de alertar as pessoas sobre o perigo do Vírus Hepatite C (HCV). E a música, arte, entretenimento e media serão os meios utilizados onde teremos a presença de vários músicos de renome e internacionalmente convidamos a todos os músicos para se juntarem a este projecto planeado para ser levado a cabo anualmente. Tudo isto foi desenhado há anos até que sentimos que os desafios tinham sido resolvidos. Encorajamos as pessoas a fazerem o teste do HCV, para que se evite o alastramento desta doença, a mesma que surpreendentemente e desnecessariamente tirou a vida da Tawn.
Tenho muitos músicos de renome por anunciar os quais se predispuseram a tocar no meu álbum pessoal dedicado a minha irmã Tawn e para a digressão da Tawn Mastrey Foundation’ (TMF), e neste momento vou fazendo a audição da banda que levarei comigo para a tournée pelo mundo.
Todavia não temos o alinhamento final de todas as bandas que farão parte desta digressão, mas temos muitas propostas. Resta-nos apenas coordenar as datas dos eventos com as pessoas disponíveis de acordo com as datas a serem estabelecidas. Faz parte do plano dos que vão estar em palco e vamos começar a arrecadar fundos para a digressão com vários produtos, mercadorias memoráveis e doações para esta acção silenciosa.
Tawn Mastrey, é a lendária DJ Heavy metal da Rádio 93x bem conhecida pelo seu trabalho nos Estados Unidos da América. Geralmente reservada a ficção, depois dos 17 atinge a Califórnia na área da Baia e Los Angeles onde estava baseada. Tawn realizou entrevistas com estrelas do rock amigas como Slash, Ozzy Osborn, Sammy Hagar, Montle Crue e Poison. Sua página foi creditada por ter rebentado com AC/DC e o single dos ‘the police’ com a música Roxanne’, no seu programa de rádio na antena nacional naquele País. Adoeceu em 2002 de uma doença que ela não sabia qual, e faleceu a 2 de Outubro de 2007 com 53 anos.
‘As pessoas não fazem o teste porque não sabem que esta doença existe’.
E.V: Nesta digressão pelo mundo o que vão levar para as diferentes audiências?
C.M: Algo que eles nunca viram ou ouviram. Música forte, um palco carregado de enorme baterias, músicos talentosos, movimento, uma fábrica de cores e luzes e convidados de surpresa. Um entretenimento completo, mas acima de tudo educação através da experiência.
E.V: Que te vem em mente quando estás no palco?
C.M: A emoção das palavras que canto, o que sinto no momento e a música, embalam-me. A expressão na cara da audiência, a forma tão vulnerável como a expressão deles aparece aceitando as emoções por mim expressadas. A energia do público alimenta-me e retribuo com amor. É como fazer sexo, esta é a melhor discrição. No palco estou na zona, e a actuação irrompe como um vulcão excitado, levando a audiência a uma viagem que finda alcançando um clímax satisfatório para todos. Uma sessão de amor que explode em orgia. Nada me assusta.
E.V: Que livro consideras mais importante na tua leitura?
C.M: ‘Choque do futuro’ de Aldoux Axley.
E.V: Esta permanente procura do outro, dos nossos fantasmas e por ai além… De que andas tu à procura nestes 40 anos de idade que tens?
C:M: Quero encontrar e criar com muitas pessoas. O David Bowie está na minha mente, Paul C:M: McCartney, David Gilmour, Lenny Kravitz, Prince, Metallica, Madonna. Gostaria de actuar com Keith Richards. E porque não um dueto com Mick Jagger. Quem não gostaria?
A única pessoa que encontrei desta lista foi o Prince mas ainda não tive a oportunidade de criar com ele. Existem milhares de músicos desconhecidos com um talento formidável, e fui encontrando-os através do My Space com os quais também gostaria de actuar.
E.V: Fase boa e má na tua carreira?
C:M: Na minha vida faço a simbiose do bom e o mau. O mau torna-me forte e faz-me apreciar o bom. Não espero nada para além da vida isto para não ficar desapontada. Tudo é uma dádiva, então o mau também é o bom.
E.V: Projectos para este ano?
C:M: Tocar freneticamente o Rock Pesado (Hard Rock) ao vivo e disseminar a informação sobre a problemática do Hepatite C através da música, arte, entretenimento, medias, digressão mundial, através da rádio, entrevistas, filmes e documentários em prol da Fundação Tawns Mastey (TMF). E como fundadora e directora executiva da fundação estou honrada por poder servir as pessoas. Criar, criar e criar.
segunda-feira, 4 de janeiro de 2010
YURI DA CUNHA
Dois concertos mesmo balanço
Texto e fotos por Estacios Valoi
30/12/09
Ainda estávamos no Aeroporto Internacional de Maputo numa daquelas noites da semana passada quando é anunciada a chegada do músico e a sua banda de 24 pessoas. Ou melhor, 10 músicos e 4 bailarinas. 24 porque desta vez trouxe a casa, a família, malas, e outros utensílios, afinal o seu natal seria festejado no palco do Coconut no dia 24 de Dezembro e mais tarde, no dia 26, no Big Brother - por sinal a produtora do evento onde esteve em palcos com artistas moçambicanos como Samson, Mega Jr, Sweet Boy's e Neima. O evento foi possível com o apoio das Linhas Aéreas de Moçambique, G.U.T produções, Mira Mar cervejaria, Hotel turismo. Bem-haja em prol da cultura!
Mas a surpresa no segundo dia do concerto onde estiveram 2000 pessoas foi a nova jovem cantora moçambicana Cuca que recentemente voltou da Dinamarca onde esteve a actuar na 15ª Conferência Climática das Nações Unidas. No Big Brother actuou com o músico Yuri da Cunha e foi de arrepiar.
Mas a minha viagem é levar-vos sim ao encontro do Yuri da Cunha, músico Angolano com um percurso artístico muito longo trabalhando em prol da música de África, no geral, e em particular, de Angola. Cada vez mais representa ritmos afros numa dinâmica musical fazendo com que o mundo conheça cada vez mais os países que fazem parte do seu dia-a-dia, como Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné Bissau, levando essa voz do povo que às vezes se cala através da música que faz para o mundo inteiro.
E.V: Onde é que o menino Yuri levou as mangas do vizinho?
Y.C: Esse sempre foi um miúdo muito traquina. Essa das mangas, a minha tia tinha uma mangueira ‘pau de manga’ em casa e nós passávamos o dia todo debaixo dela. Tinha um primo mais velho que era o Ruca, o controlador das mangas, e eu tirava-lhe as mangas e basava, o que à noite dava sempre problemas. Mas, a estória da minha traquinice que me marcou foi quando cortei o pénis de um macaco que tínhamos em casa e o meu pai ficou furioso comigo e deu me uma tarei, ainda bem, a educação africana sempre foi com correctivos, fazem bem. Hoje estamos aqui nós miúdos, crescidos, educados, bem aprendidos, apesar de que sou contra a violência mas às vezes um puxão de orelhas faz bem.
E.V: Depois do correctivo quando é que te ‘refugias’ na música?
Y.C: Muito novo, nasci na província de Kwanza Sul e depois dos 4 anos de idade fui viver na Capital Luanda. Mas quando me encontrei como pessoa já era músico, aos 2 anos de idade já andava pelos ao palcos a ‘reboque’ do meu pai que é músico e durante a minha escolaridade também representava as minhas escolas. Quando miúdo representou Luanda num concurso inter-provincial musical e em 1993 entrou para a escola pioneira da Rádio Nacional de Angola
E.V: Levar a música africana para mundo. Qual é o estágio desta?
Y.C: É preciso fazer mais fusão com outras músicas mas sempre com o pé assente no chão e dizer que temos uma identidade, estamos em Moçambique e temos a Marrabenta como cartão postal. Aqueles estilos musicais que são característicos, como a música cubana o que se fez com Compay Segundo (Buena Vista Social Club), esse grupo todo de artistas cubanos que de repente sai do anonimato para se virarem para o sucesso mundial. Mas é preciso ter uma boa equipa de jornalistas, de produção e promoção para eventualmente podermos chegar aos grandes muros.
E.V: Estamos a perder a identidade africana?
Y.C: Vou falar mais de Angola que é onde eu resido, estamos a viver um momento inverso, a juventude começa a fazer mais música de raiz relativamente a anos passados em que não se ouvia nada de raiz, porque acho que a guerra trouxe muitas coisas péssimas mas com ela também esse sentido multicultural. Creio ser positivo no sentido das pessoas terem o conhecimento dessa raiz mas não de a enraizarem, dai que hoje sinto que tivemos um crescimento grande e vamos continuar porque as pessoas estão decididas a fazer o seu melhor.
E.V: Quantos álbuns e em qual encontras o teu ‘eu”?
Y.C: 3 Álbuns e encontro me mais no disco intitulado ‘Eu ‘ por sinal o segundo, contudo o nosso mais recente trabalho discográfico tem também as minhas características.
E.V: Longa carreira artística qual foi a fase mais conturbada e próspera?
Y.C: A mais crítica foi de 1999 até 2003 porque foi muito difícil, depois de ter gravado o disco as coisas não correram como o previsto. Retorno para Angola vindo de Portugal onde estava a viver a procura da reafirmação, o encontro com todas aquelas coisas novas, foi muito difícil e os bons são este tempo em que a gente tem somado progressos relativamente àquilo que definimos como metas a atingir que é elevar a música Angolana, principalmente criar bases e alicerces bem firmes no sentido de amanha podermos ver os nossos filhos seguirem o mesmo caminho que é a identificação da nossa cultura.
E.V: Maputo com 40 graus centígrados, este calor e o público?
Y.C: Acho que os carros em si já controlam o mecanicismo certo, funcionando com hidrogénio e as fábricas que poluem muito… penso que o homem já encontrou o antídoto mas o mais importante é trabalharmos no sentido de não matarmos o mundo. Muita dança, animação, como tem sido sempre, o meu reportório vem carregado de algumas músicas antigas incluindo as do novo álbum intitulado kwuma kwaki, que significa amanheceu em Kibundo, língua tradicional de Angola e outras participações que fomos fazendo em outros discos que têm tido sucesso em Angola, sempre com a dança pelo meio.
Estes discos resgatam a música Angolana, com ritmos tradicionais mas também misturam elementos da música mundial como o funk, rock, pop e balada, sem perder a essência da música africana particularmente a angolana.
E.V: A primeira vez que actuaste em Moçambique te auto convidaste depois de uma conversa com o Júlio Sitoe. Desta vez como é que foi?
Y.C: Foi um pouco difícil decidir actuar em Moçambique nestas datas já que coincidem com o dia da família, 25 de Dezembro, mas trouxe membros da minha família já que temos que partilhar este dia com aqueles que nós amamos, aceitámos. Moçambique faz parte desse amor que nós transportamos. Depois de Angola, Moçambique é o meu segundo País de eleição no mundo todo e depois o Brasil. Moçambique proporciona-me mais um pouco relativamente àquilo que Angola me dá. A humildade dos moçambicanos, é tudo o que se pode ter num mundo minado de amor e é a primeira vez que vou passar um natal em trabalho, fora de Angola.
‘Sou apologista de que devemos resgatar os nossos valores, no Brasil ouve-se música brasileira e temos que valorizar as nossas coisas africanas’.
E.V: De onde surge esse ritmo Kintwene de que tanto falas?
Y.C: Kintwene é um ritmo de Cabinda, mas deixa-me dizer que estivemos num show na África do Sul aquando da celebração do Dia de África com vários artistas da raça africana, e falámos sobre isso. Vais aos Estados Unidos da América e não ouves música africana, Portugal idem. Os africanos têm essa potência africana cultural e se nos unirmos, com certeza mostramos ao mundo aquilo que nós somos e queremos.
A cada dia que passa o mundo vai se globalizando. mas essa não é a globalização da América, nós aqui cada dia que passa ouvimos musica americana. Quem aqui não conhece a Byonce? Todos. O Stewart Sukuma um grande musico moçambicano mas que quase ninguém o conhece em Angola, Dodo Miranda e muita gente não conhece.
E.V: Que se pode esperar de 10 músicos e 4 bailarinos em palco?
Y.C: Este show vai ser o show e não, mais um show com 13 composições do novo disco que traz a mensagem de paz, reconstrução e amor entre irmãos. Em Angola saímos de uma fase muito crítica que foi a guerra e muita gente cruzou os braços pensando que as coisas caiem do céu. E nós que já caímos tanto, sonhamos sempre com um novo dia, por isso o título do álbum é “Amanheceu”. Se o angolano esperar que o brasileiro venha fazer por ele, vai ser complicado. É preciso ir à procura daquilo que nós queremos, e aceitar que não sabemos nada. O angolano tem muito dessa mania de pensar que estamos em grandes mundos.
A primeira vez que vim a Moçambique fiquei surpreso, é assim tão rico! Tiveram a humildade de aceitar apreender e crescer.
E.V: Novos projectos?
Y.C: Temos uma digressão em que vamos escalar vários países da Europa e Cuba, a qual terá a sua abertura com a nossa participação em palco com o músico italiano Eros Ramazoti. Também fiquei satisfeito com o acordo rubricado entre as Linhas Aéreas Angolana TAG e a Moçambicana LAM que vai trazer benefícios no turismo. Mais angolanos e moçambicanos podem viajar em ambas as direcções, o dinheiro entra nos dois países. Nós pagamos e vamos passar férias em Portugal mas o português não vai passar férias em Angola, vai trabalhar em Angola. Por isso todo o dinheiro que sai de Portugal, a ele volta.
E.V: No fim, até os chuviscos que se fizeram sentir não afugentaram o público que lá esteve em massa.
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