Estacio Valoi
22 Agosto 2017 Oxpeckers Reporters
Mais de 90% da madeira moçambicana é exportada para a China com menos valor
do custo real. Estacio Valoi expõe a colisão existente entre agentes-Despachantes,
funcionários aduaneiros e gestores portuários
Enormes quantidades de madeira indígena são
transportadas de Moçambique à China através dos portos das regiões Centro e
Norte do país, como o Beira e Nacala. Depois de receber informações de funcionários
do porto, o jornalista testemunhou factos de exportação ilegal envolvendo agentes
Despachantes e funcionários das alfândegas em colisão com Administradores do
porto.
Caminhões carregados de madeira trabalhada
e em toros a caminho do porto do norte. Fotos: Estacio Valoi
Investigações com duração de um ano
revelaram que uma empresa com altas ligações com o Ministro de Transportes e
Comunicação, Carlos Mesquita sobressaiu no centro destas actividades no porto
da Beira: A Rotterdam-based Cornelder Holdings. Desde 1998 que a empresa é
parceira dos Portos e Caminhos de Ferro de Moçambique numa joint venture conhecida como a administração da Cornelder Moçambique.
A mesma é descrita por pessoas internas
como os “ovos de ouro” da dinastia
Mesquita.
“Toda a carga é estritamente controlada
pela administração (Cornelder)…centenas, milhares de contentores. É de onde
provém o seu dinheiro. Frete” disse um dos oficiais na Beira, que pediu
anonimato por receio de perder o seu o emprego.
De acordo com um relatório do Ministério
de Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural (MITADER) que analisa a importação
de madeira registada pela China entre os anos de 2005 e 2016 defere
significativamente – ronda aos 950 milhões de dólares – dos dados de exportação
registados pelas Alfândegas de Moçambique, e os Serviços de Floresta e Fauna
Bravia, entidades responsáveis pela exportação de madeira.
Portos de exportação: a Beira no centro do
país e Nacala no norte são os principais portos de contrabando de madeira. Mapa
cortesia das bibliotecas da Universidade de Texas
Beira o
‘Primeiro ponto de saída’
É através do
porto da Beira o ‘primeiro ponto de saída” administrado pela Cornelder donde a
maior parte da madeira é exportada. De acordo com a sua página online, a empresa mantém um controlo
severo sobre as exportações, com um sistema de segurança de câmaras CCTV
instaladas em pontos estratégicos.
Fontes que
trabalham no porto da Beira referem que este controlo gerou grandes riquezas
para a “Dinastia Mesquita” e que para os proprietários do Porto “apenas o
dinheiro importa”.
“ As autoridades do Porto está informado de
tudo o que acontece” disse a nossa fonte trabalhadora no porto da Beira.”
Recentemente,
Mesquita foi convocado pela Comissão Central de Ética Pública, criada à luz da
Lei de Probidade Pública, para fazer face às preocupações de alegado conflito de
interesses que envolve uma empresa parcialmente pertencente a si.
Sua aparição
estava relacionada com um contrato adjudicado pelo Instituto Nacional de Gestão
de Calamidades sem concurso público, para a empresa de Transportes Carlos Mesquita
Ltd (TCM). O ministro é um dos proprietários do Grupo Mesquita, principal accionista
da TCM, adjudicada com um contrato no valor de 20 milhões de meticais o
equivalente a (296 000 dólares) em Fevereiro deste ano.
Em direito a
resposta, perguntas enviadas a Mesquita-Cornelda sobre as suas ligações com a empresa
e as alegações que a empresa estivesse a fazer vista grossa em relação a exportação
ilegal de madeira, declinou-se responder. A Cornelder também não deu resposta a
estas mesmas alegações.
Em Outubro
do ano passado em mais uma tentativa de exportação ilegal de madeira em 1500
metros cúbicos de Moçambique com destino a China foi apreendida no Porto da
Beira. Oficias do MITADER e dos Serviços de Floresta e Fauna Bravia confiscaram
camiões transportando madeira a partir de Tete, porque a carga estava acima da
recomendada por lei.
Este vídeo feito
por um cidadão em Julho de 2017 que ilustra caminhões de madeira que saem das
florestas de Moçambique, tornou-se parte de uma petição ao governo e ao Banco
Mundial. A campanha também mapeou 37 estaleiros chineses de madeira num
percurso de 45 km da estrada EN6 ate ao porto da Beira.
Medidas
do Governo
No início do
mês de Novembro, do ano passado, o parlamento Moçambicano aprovou uma
lei que proíbe a exportação de madeira em torro, a esta lei entrou em
vigor a 1 de Janeiro de 2017. A proibição não se aplica a madeira semi
processada, como vigas, tábuas e parquê, ou produtos acabados como mobília.
Outras
medidas do governo para travar o saque da madeira incluíram a “Operação tronco”
que levou os serviços de floresta no centro e norte, a efectuar inspeções a
operadores de madeira e culminou com a apreensão de 150. 000 Metros cúbicos de
madeira ilegal entre os meses de Janeiro e Março de 2017.
O ministro
de Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural Celso Correia disse no mês de Abril,
que mais de 120 estaleiros de madeira foram inspeccionados, maior parte deles
pertencentes a cidadãos Chineses e operações ilegais foram detectadas em 75 % dos
estaleiros inspeccionado.
Correia
disse que operações ilegais de extração de madeira, custavam ao país entre 150
a 200 milhões de dólares por ano. Durante o período de medidas contra operações
ilegais, foram aplicadas multas no valor acima de 157 milhões de meticais (2.5
milhões de dólares).
Durante a “Operação
tronco” a exportação de madeira foi interrompida, contudo, de modo a minimizar
as perdas dos operadores madeireiros legais, Correia autorizou a exportação de certas
cargas com as devidas licenças e impostos pagos.
As redes dos
ilegais, também aproveitaram-se desta permissão para contrabandear contentores
cheios de madeira ilícita para a China.
Os registos
dos Serviços das Alfândegas da China, indicam que durante o mês de Abril 64.000
metros cúbicos, avaliados em 28.3 milhões de dólares, foram importados de Moçambique.
Em Maio, cerca de 32.000 metros cúbicos avaliados em 16,468,080 dólares foram também
importados.
(Este gráfico, de um relatório do Ministério da Terra, do Meio
Ambiente e do Desenvolvimento Rural (MITADER), mostra como as importações de
madeira registradas pela China entre 2005 e 2015 diferem muito - cerca de US $
950 milhões - dos correspondentes dados de exportação documentados por
Moçambicanos Alfândega e os Serviços de floresta e Fauna Bravia)
A
investigação
As
investigações com duração de um ano pelas rotas da madeira, seguindo o fluxo da
madeira das florestas de Nampula e Chimoio para os portos de norte e centro,
indicam exportação ilegal de madeira.
Para
investigar o processo a partir de dentro dos portos, este repórter identificou-se
como um homem de negócios ansioso por transportar “em particular de forma
ilegal” madeira a partir de Tete, que se encontrava em um campo inexistente no
distrito de Dondo, cerca de 50 km da Cidade da Beira.
Operadores
do porto, oficiais das Alfândegas e Despachantes, disseram que a situação era
“quente” mas não era impossível. Um dos despachantes “Elton” muito conhecido na
Beira, ofereceu-se para exportar a madeira, desde que a parte paga a si
cobrisse toda a operação. Era condicional que o suborno fosse partilhado com o
despachante, oficiais das alfândegas envolvidos.
“Tem de
pagar 150 dólares por contentor, isso dá-me uma margem para pagar os meus
homens” disse ele. “ Não se preocupe com os agentes, scanners de controlo e oficiais das alfândegas. Trabalhamos todos
juntos”.
Expliquei
que tínhamos 40 contentores para exportar e queríamos um desconto. “ Claro, por
40 contentores pagas um valor de 25 000 meticais por cada (cerca de 400 dólares),”
disse Elton.
Pedí para
conhecer os seus associados das alfândegas e os controladores dos scanners
da Kudumba. “ Vais conhece-los assim que fizeres o primeiro pagamento” disse
ele “e quando trouxeres os contentores para embarcar".
Este cenário
repetiu-se com vários despachantes. Alguns eram mais cautelosos. Um dos agentes
“Donald” quando abordado sobre o mesmo assunto, respondeu discretamente: “Nós podemos
exportar. Temos nossos próprios meios de fazê-lo".
Um oficial
das alfândegas da Beira, acrescentou que a madeira poderia ser carregada aos
contentores para embarque fosse qual fosse a sua característica.
Funcionários
do porto e vendedores de madeira na Beira, disseram que os Chineses estavam a
comprar enormes quantidades de madeira. “Dinheiro fala mais alto. "Tu
vendes madeira quente e mesmo que seja ilegal, chega-se a uma negociação com os
oficiais das alfândegas,” disse um funcionário do Porto.
Funcionários da (MITADER) com um dos troncos gigantes apreendidos na
rota do porto de Nacala: Foto Estacio Valoi
Apreensão
em Nacala
De acordo
com a direcção provincial da MITADER em Nampula, 28.895 metros cúbicos de
madeira foram exportados da província para a China no primeiro trimestre de
2017 – 90% dos quais via o Porto de Nacala.
Foi em
Nacala onde o antigo Ministro da agricultura, Tomás Mandlate e uma empresa
parcialmente pertencente a si, tentou exportar 1020 contentores de madeira para
a China em Dezembro passado. Pelo menos 390 dos contentores foram encontrados no
recinto do Terminal de Exportação Especial de Nacala, uma empresa privada em
que Mandlate é accionista e presidente da direcção.
A equipa do
MITADER, encabeçada pela Directora nacional, Olívia Amosse, apreendeu madeira e
multou empresas em 15 milhoes de meticais (cerca de 207 000 dólares). Os
contentores remanescentes foram encontrados no recinto de 3 empresas chinesas,
Yzou, Zeng Long e Yang Shu.
Amosse disse ao semanário indenpendente Savana que um total de 33.000
metros cúbicos de madeira dura, teria sido exportado ilegalmente para
China se sua equipa não tivesse intervido.
Ela disse
que a situação encontrada em Nacala “era muito estranha” e mostrou que “estamos
a enfrentar o crime organizado”. Era inconcibível que três entidades de
aplicação da lei (a Polícia, a Autoridade Tributária, e o Ministério de Ambiente)
não tivessem notado o que se estava a passar, disse a Directora.
Outras
remessas ilegais de madeira encontradas em Nacala eram disfarçadas. Em Outubro,
por exemplo, 16 contentores de maderia dura, declarada como fibra de algodão
com destino para a China foram apreendidas por uma força conjuta de
oficiais da floresta e alfândegas. A madeira alegadamente pertencia a um
sindicato Chinês baseado no Malawi.
Três
contentores da madeira Pau- ferro, declarada como castanha de caju com destino
para China em Maio foram apreendidos em Nacala. O carregamento pertencia a uma
empresa Chinesa de nome ABC, a madeira estava coberta de uma falsa documentação
e tinha sido abatida durante o período de defeso.
A Procuradoria
Geral prendeu dois oficiais do porto, sob acusações de branqueamento de capitais
e contrabando de madeira. Três dos 18 membros do ABC foram presos por
branqueamento de capitais enquanto outros encontram-se foragidos.
Um Oficial
da Direcção provincial do MITADER em Nampula, disse que a madeira é
frequentemente exportada sob categoria de castanha de caju fazendo uso de mais
de uma licença.
“Os contentores são registados com duas
licenças de exportação, uma como castanha de caju e outra como madeira.
Enquanto a primeira licença é usada para ter acesso ao porto moçambicano para
exportar, a segunda é usada para o seu destino final, a China, onde o
verdadeiro produto dentro dos contentores, madeira, é declarada".
Links relacionados:
•https://www.change.org/p/celso-correia-para-com-o-genocidio-chines-contra-as-nossas-florestas-stop-chinese-forest-rape-genocide-in-mozambique?recruiter=92330304&utm_source=share_petition&utm_medium=copylink&utm_campaign=share_petition
Estacio Valoi é jornalista investigativo
moçambicano. Esta investigação foi produzida pelo Oxpeckers Jornalismo de Investigação
Ambiental, apoiado pelo Projecto Reportar sobre Corrupção e Crime organizado (OCCRP)
e co-financiado pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF) em Moçambique.
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